*Por Leônidas Pellegrini (Revista Terça Livre),
Um dos fatores que o professor Olavo de Carvalho
aponta como direta e intrinsecamente relacionado à decadência do
pensamento e da cultura ocidentais é a crise de sua literatura. No
Brasil, Olavo avalia que, após a década de 60, a decadência da
literatura é patente, sendo que bons autores tronam-se cada vez mais
difíceis de se encontrar, constituindo “ilhas” em meio a um mar de
mediocridade.
Essa realidade também se reflete na literatura
infanto-juvenil, território em crise há algum tempo, e que vem sendo
invadido por ativistas, lacradores e youtubers charlatães. Como filho de
um escritor que possui uma vasta obra infanto-juvenil e professor de
língua portuguesa que trabalhou por dez anos (de 2009 a 2019) com o
ensino fundamental, vejo com preocupação os livros que têm sido
destinados às escolas e, principalmente, os adotados por muitos
professores (obras que revelam uma preocupação muito maior com o
levantamento de “debates” para fomentar o “pensamento crítico” que em
despertar o gosto pela leitura).
As crises, no entanto, podem suscitar reações que
inspiram esperança. É o que vejo no escritor Dennys Andrade, com quem
tive contato por meio de meu amigo Giorgio Cappelli. Pai de duas
crianças e um adolescente, após uma valiosa experiência com a política
partidária e um período de silêncio e estudo, Dennys viu-se inspirado
pelos mestres Olavo de Carvalho e Homero a iniciar um projeto de vida
visando à reabilitação de valores possivelmente perdidos no imaginário
das novas gerações.
Com isso, nasceu a coleção Pequeno Teatro, que já
conta com dois volumes: “Civilização Ocidental” (inspirado nos escritos
de Olavo) e a adaptação de Homero “Ilíada e Odisseia”, peças para serem
encenadas por alunos do ensino fundamental (à venda na Livraria Terça
Livre, link ao final).
Em entrevista exclusiva à Revista Terça Livre,
Dennys Andrade falou sobre sua formação, influências e trajetória
intelectual, assim como sua visão da crise no mercado editorial
infanto-juvenil e seus planos editoriais. Confira abaixo.
Terça Livre: Dennys, em primeiro lugar, gostaria de saber sobre sua formação como leitor e como escritor, suas principais referências, etc.
Dennys Andrade: Minha família
costumava passar os finais de semana na casa de minha avó paterna, em
Santa Isabel. Como uma forma de controlar os filhos nessas viagens
curtas, meu pai enchia os filhos de gibis. Eu acompanhava as imagens e
fazia a associação com as letras. Quando os gibis já não davam mais
conta, vieram as revistas, que se transformaram em edições dominicais
grossas do Estadão. Virei um leitor devorador. Já adolescente, meus
favoritos eram Isaac Asimov, Machado de Assis e Oscar Wilde, cuja
tradução de Oscar Mendes é, até hoje, minha referência de como a língua
portuguesa pode ser maravilhosamente bem escrita.
Formei-me em Geografia na USP e, apesar de o gosto
por filosofia e política, passei ileso. Entrei para o partido NOVO após
as “jornadas de julho”, quando comecei a escrever o blog “30 Diários”,
como uma forma de juntar informações sobre o partido e de discorrer
sobre formação política. À mesma época, comecei a acompanhar o True Outspeak
e a ler as obras de Olavo de Carvalho. Com o blog, aglutinei muitas
pessoas e também questionamentos em relação ao partido, que levaram, por
fim, ao colapso do diretório paulista e à primeira deserção em massa
dos filiados, em agosto de 2016.
Desde então, seguindo os conselhos de Olavo,
comprometi-me a parar de escrever (besteiras) e me dedicar apenas à
leitura. Assim foi até 2019, quando uma confluência de fatores propícios
me levaram a publicar a primeira obra voltada para o público
infanto-juvenil, o “Civilização Ocidental”.
Terça Livre: Tenho uma experiência
de 10 anos trabalhando com ensino fundamental, e tenho uma visão bem
clara da crise pela qual passa tanto nossa produção infanto-juvenil como
a escolha das obras para leitura dos alunos, que muitas vezes são
destinadas a ocasionar o “pensamento crítico” do que o gosto pela
leitura. Gostaria que você comentasse sobre essa situação.
Dennys Andrade: Sabemos dos fatores
que nos trouxeram até aqui, mas não adianta ficar discorrendo sobre os
efeitos sem tratar da solução. O primeiro passo já foi dado, que é ter
consciência do problema que foi tratar a educação como um ato político. O
passo seguinte, para alterar essa realidade, passa pela produção de uma
literatura de qualidade e pela criação de canais que possibilitem a
essa produção encontrar o seu público. De nada adianta ter a ciência da
necessidade e não encontrar os insumos para supri-la.
Para conseguir publicar e viabilizar comercialmente o
primeiro volume da coleção Pequeno Teatro, destinado ao ensino
fundamental, foi necessário realizar um verdadeiro périplo atrás de
licenças, carimbos, senhas, registrando e pagando taxas, tendo que virar
perito em legislação tributária para poder emitir uma simples nota
fiscal. Não é sem fundamento que boas iniciativas pessoais simplesmente
morrem em seu nascedouro.
Para quem atravessa a selva da burocracia e assume o
investimento por conta e risco, existem os canais privados como a
Amazon, o Mercado Livre e os nacionais, como a B2W (Submarino,
Americanas etc). É quando a sua produção é exposta que surge a realidade
mercadológica: se ninguém conhece, ninguém lê. Aí é que entra em cena o
ator mais importante – de longe! - da atual conjuntura cultural
brasileira: o CEDET. O trabalho de César e sua equipe,
“desburocratizando” o acesso dos brasileiros à produção literária de
qualidade, abriu a porta do que é bom e de qualidade para o mercado
nacional e será responsável por um enorme impacto positivo na sociedade a
médio prazo, mais do que qualquer outra iniciativa “pública”.
Terça Livre: Gostaria que vocês nos
falasse um pouco sobre sua proposta com a coleção Pequeno Teatro, e
também sobre seus livros já lançados nessa coleção. Qual foi a motivação
para escrevê-los, sua gênese e desenvolvimento, etc.
Dennys Andrade: Como eu já comentei
para a Bruna Torlay, a coleção surgiu com a proposta de religar, de
abrir as portas dos clássicos para os alunos. Estamos formando adultos
para uma sociedade cada vez mais complexa e especializada, cujas áreas
de atuação (religião, artes, política, etc) são praticadas de forma cada
vez mais isoladas, ou seja, sem comunicação uma com as outras. O
próprio conceito de arte abstrata (década de 50) surge como um reflexo
dessa separação. Essa arte, separada de qualquer outra ligação que lhe
dê substância, é extremamente pobre. Olavo, em seu livro Dialética
Simbólica, afirma que o homem moderno não consegue raciocinar
analogicamente, pois quando você cria um objeto sem significado você
nega as analogias e os simbolismos. E o que o homem (o aluno) não
entende, sem a dialética simbólica, ele vai abstraindo.
A motivação da obra foi a necessidade de apresentar
aos jovens os nossos valores mais caros: bravura, compaixão, ética,
justiça e lealdade, fazendo a religação desses símbolos com os seus
significados reais utilizando
exemplos de ações e, uma vez concretizada essa ligação, abrir o caminho
para que eles apliquem e os transmitam da forma correta. Poucos autores
fazem essa “transmutação” da experiência real, de expressar o referente
(o fato) em palavras com excelência. É aí que entram os clássicos, pois
eles conseguem fazê-lo de maneira inigualável.
São dois os volumes já lançados: “Civilização
Ocidental” e “Ilíada e Odisseia”. O primeiro foi inspirado no texto
“História de quinze séculos” do Olavo, no qual o professor abusa do seu
poder de síntese e resume magistralmente toda a nossa herança
civilizatória em menos de 700 palavras! Minha ideia foi dissecá-lo em
tópicos temporais, unindo e contextualizando os capítulos por uma linha
narrativa e utilizando da performance teatral para reforçar a absorção
do conteúdo pelos alunos. Tudo acompanhado pelas belíssimas ilustrações
de Pedro Lorenzo, talentosíssimo artista londrinense.
Com a excelente repercussão do primeiro volume e de
seu formato, voltei-me para a adaptação dos maiores cânones da
literatura ocidental: Ilíada e Odisseia. Foi uma aventura deliciosa
mergulhar de cabeça, não apenas nos dois livros, mas também poder
adicionar o “Proêmio”, um capítulo extra que antecede os demais e
detalha todos os eventos que antecederam e que desencadearam as duas
obras homéricas. O resultado foi um livro levíssimo, nas palavras da
Bruna: “uma tradução para o público infanto-juvenil, fidelíssimo ao
aspecto principal dos poemas: a excelência constante, ou, energia vigorosa da primeira à última sílaba.”
Terça Livre: Como você já trabalhou
com uma adaptação das obras Ilíada e Odisseia para o público juvenil,
gostaria que nos falasse como vê a questão das adaptações de clássicos
da literatura para o mercado infanto-juvenil.
Dennys Andrade: O mercado literário
infanto-juvenil sofre com a recente invasão dos famosos “youtubers” e
sua disputa desmesurada por ‘likes’. Como pai de duas crianças e um
adolescente, eu procuro controlar o conteúdo que chega até eles, sempre
dando o exemplo, praticando a leitura juntos e oferecendo conteúdos que
lhes prendam a atenção. Ainda assim, é impossível controlar tudo o que
eles consomem, pois, muito vem através dos amigos e colegas.
Por esse motivo, é importante haver opções de
qualidade para se fazer a devida introdução aos clássicos, às grandes
ideias, ou que entrem em conflito com o viés marxista predominante. A
boa notícia é que estão começando a surgir bons projetos voltados para o
segmento infanto-juvenil. Posso citar a “Turminha da Liberdade”
(Miotto, 2018), a HQ “Austrinho” (IFL, 2018), a série “Desbravando o
mundo livre” (IL, 2019) e as HQs de Luciano Cunha: Doutrinador (Cinema e
TV, 2018) e Destro (Super Prumo, 2020).
A demanda existe, mas faltam produtos literários acessíveis a esse grupo etário, especialmente aqueles focados diretamente
no âmago dos valores conservadores, coisa que tanto a obra de Olavo de
Carvalho quanto os clássicos literários, fazem com perfeição. A
adaptação da “Ilíada e Odisseia” para o teatro do ensino fundamental foi
apenas a ponta do iceberg.
Terça Livre: Poderia nos dizer quais serão as próximas adaptações da coleção Pequeno Teatro e os projetos da sua editora, a BKCC Livros?
Dennys Andrade: As publicações vão
seguir um calendário baseado nas próximas efemérides comemorativas, para
aproveitar o interesse natural do público e da mídia. Para 2021,
teremos o lançamento da adaptação teatral da “Divina Comédia”, em
comemoração aos 700 anos da primeira edição de Dante Alighieri (1321).
Em 2022, será a vez de oferecer “Os Lusíadas”, em comemoração aos 450
anos da obra de Luis de Camões (1572). Também para 2022, laçaremos um
volume especial em comemoração ao Bicentenário da Independência do
Brasil. A ideia é fazer a garotada subir nos tablados para interpretar
um Dom João VI, um Dom Pedro I, uma Princesa Leopoldina, José Bonifácio,
enfim, criar uma obra digna, que seja realmente um ponto cardeal na
mudança cultural que desejamos. Outros cânones e passagens históricas
nacionais também estão na lista.
Quero aproveitar a parceria oferecido pelo CEDET e a
possibilidade de focar apenas no que realmente interessa: conteúdo de
qualidade. Então, a ideia é abrir as portas da editora para novos
autores, com boas obras, orientadas para o público-alvo da editora – o
infanto-juvenil. Nessa linha, já temos algo planejado para os próximos
meses, que é um livro que fala sobre “Heróis e Gênios”, brilhantemente
organizado pelo manauara Leandro Flaiban.
Outras frentes incluem a publicação de cadernos de
atividades vinculados aos volumes da coleção Pequeno Teatro e a criação
de pequenos cursos e/ou adaptações das obras para o formato de uma série
de pequenos vídeos animados, por meio de uma grande parceira, de enorme
sucesso na produção de conteúdo audiovisual.
Fonte / Leia o conteúdo completo da Revista Terça Livre (edição 66) em:
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