sexta-feira, 14 de outubro de 2022

PEQUENO TEATRO DA LIBERDADE - 12.1/14

Ato XII.Cena1 - Lei do Inquilinato feliz

VOANDO RUA ABAIXO ATÉ encontrar as pessoas que haviam deixado a praça momentos antes, Jonas pensa que, agora, no meio da multidão, estará a salvo do sábio paranoico. A maior parte das pessoas para em frente a três pequenos sobrados. O primeiro, é uma pensão caindo aos pedaços, ainda com partes das paredes pintadas em azul, parecendo abandonado; o segundo, pintado de amarelo, é uma pensão apinhada de gente, com trapos velhos secando nas janelas, pendurados por todos os lados; o terceiro e último sobrado está pintado em um vermelho novo, tão forte, que chega a refletir a luz da Lua cheia que desponta no horizonte. Está lindo, parecendo que sequer fora habitado. Jonas observa as pessoas e os sobrados, tentando entender a situação e não nota que também é observado por uma menina que se aproxima, curiosa.

JONAS
- Por que será que todos ficam no sobrado amarelo? - A mão pequena e delicada da menina de vestido azul com laços amarelos lhe toca o ombro e Jonas dá um pulo de susto. Ele congela no tempo por um instante mas logo é trazido de volta à superfície pela doce voz daquela garota.

 ANA
- Desculpa, eu não queria incomodá-lo. - Diz, achando graça no menino assustado.

JONAS
- Ah.. foi nada! Incômodo nenhum. - Responde, com o coração ainda batendo forte pelo susto.

ANA
- Saberia me dizer se alguém comentou sobre um lugar para alugar na pensão amarela? - Pergunta, entre os gritos da molecada do sobrado amarelo abarrotado de gente.

JONAS
- Na pensão amarela?… ah! sim... claro, claro. (concordando positivamente) Digo... não, não! (Balançando a cabeça, em negativo) Não ouvi ninguém comentando, não sei de nenhum lugar para alugar, sinto muito.

ANA
- Ah, que pena... é inútil procurar… eu não consigo mais... - lamenta, choramingando.

JONAS
- É, veja, moça... por que você não procura uma vaga naquelas outras pensões? - Tira um lenço do bolso, lhe oferecendo para enxugar as lágrimas.

ANA
- Obrigada, obrigada. Mas é impossível. - Responde, secando as lágrimas fugidias, abaixo dos olhos.

JONAS
- Mas por quê? Parece que tem bastante espaço ainda.

ANA
- Sim, na verdade estão vazios. Minha família costumava morar naquele sobrado azul… (devolve o lenço) isso, até Dirce Tramoia convencer o Conselho dos Iluminados a aprovar a
lei do Inquilinato Feliz.

JONAS
-
Lei do Inquilinato Feliz? Soa como uma coisa boa, não?

ANA
- Não se engane… desculpa, qual é a sua graça, mesmo?

JONAS
- Jonas, me chamo Jonas.

ANA
- Bem, Jonas, os inquilinos reclamavam bastante que muitas pessoas estavam se mudando para os sobrados, de obras acontecendo e que os proprietários insistiam em aumentar os aluguéis. Todos acharam isso muito injusto e chamaram a Dirce Tramóia, explicando que não queriam pagar nada a mais por tudo aquilo e exigindo que o Conselho dos Iluminados proibissem os proprietários de alterar o valor dos alugueis.

 JONAS
- E eles conseguiram?

ANA
- Sim, conseguiram. O conselho aprovou a lei e contratou uma grande quantidade de fiscais para garantir que os proprietários cumprissem as novas regras. Também criou novas taxas, que é para cobrir o custo destes fiscais, comprar equipamentos, etc, etc, etc…

JONAS
- E os proprietários respeitaram a lei? As pessoas ficaram felizes?

ANA
- Sim, até que no início deu certo mas, depois, simplesmente não havia dinheiro para fazer a manutenção e as reformas deixaram de serem feitas. Com a inflação e o preço de tudo subindo, o valor fixo do aluguel já não cobria nem a manutenção básica dos sobrados e os proprietários simplesmente decidiram que ficava mais barato abandonar o sobrado azul, cheio de problemas… e, como dizem que não vale a pena construir para alugar, todo mundo foi para o único lugar que restou, a pensão do sobrado amarelo.

JONAS
- E você quer alugar um espaço para morar no sobrado amarelo, correto? Deve haver algum outro modo de você conseguir, quem sabe, dividir um quarto com uma outra família?

ANA
- Ah, seria ótimo! Mas é impossível, é contra as
normas de habitação (fazendo aspas com as mãos).

JONAS
-
Normas de habitação, o que é isso?

ANA
- É um código estúpido que estabelece o uso das habitações. Certas coisas como o número certo de famílias por pensão, o número adequado de pias por banheiro, a quantidade permitida de pessoas por quarto… e por aí vai… os Iluminados dizem que é para orientar o estilo de vida dos cidadãos! E nós ficamos na rua! Sem código, sem pias, nem privacidade! - Reclama, perdendo a paciência.

JONAS
- Mas… e o sobrado vermelho? Por que ninguém muda para lá?

ANA
-
Normas de zoneamento… (procura pelo chão e apanha um graveto que usa para riscar um traço no chão) é mais ou menos assim: as pessoas têm permissão para dormir deste lado da linha, à noite, mas tem que trabalhar do outro lado da linha, durante o dia. O prédio amarelo e o azul ficam deste lado, já o prédio vermelho, fica no lado de trabalhar. Só que não tem nenhuma empresa aqui e ninguém pode morar nele!

 

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